Comunidades<br>– os problemas arrastam-se
«(...) Ouvi o vento Sul que assobiava,
E de ouvi-lo folguei. Da pátria vinha:
Seu rijo sopro refrescou-me as veias»
Alexandre Herculano
A multiplicação de textos a puxar mais ou menos ao sentimento sobre as comunidades portuguesas que andam lá longe a lutar pela vida é antigo.
O problema é que lá, como cá, sendo bom que existam boas palavras, se a elas não corresponderem medidas práticas, concretas, que as materializem, de pouco servem. Ora isto é o que ano após ano tem acontecido com as comunidades: palavras muito carinhosas, mas adopção de medidas que andam ao contrário.
As alterações produzidas ao enquadramento legal do Conselho das Comunidades; o fecho de consulados; a introdução, nuns casos, de propina para o ensino de português, noutros casos, a possibilidade da sua frequência sem propina, mas como língua estrangeira; o emaranhado de problemas que afectam os trabalhadores consulares; o crescimento exponencial de portugueses nalguns países sem quaisquer medidas de reforço de pessoal nesses consulados; o uso discricionário de trabalhadores em embaixadas como se fossem «pau para toda a obra»; as deslocações de centenas de quilómetros para quem não abdica de exercer o seu direito de voto; os crescentes casos de pobreza que se registam nas comunidades, sem qualquer medida de resposta, etc., etc., contam-se entre o imenso rol de problemas.
Para a resolução de alguns destes aspectos só é preciso uma coisa: vontade política de os resolver, em vez de vontade política de os ir «empurrando com a barriga». A reconhecida falta de trabalhadores consulares em vários países (por exemplo, na Bélgica com menos de cinco funcionários para 80 mil portugueses), afectando dessa forma as comunidades na resolução dos seus problemas, necessita do quê para ser encetado o processo de resolução? Os diferentes tratamentos dos jovens portugueses no acesso ao ensino do português no estrangeiro necessita do quê para ser resolvido? E para quem tanto fala da ligação às comunidades, por que é que a eleição para o Conselho das Comunidades passou a só poder ser feito pelos recenseados nos cadernos eleitorais ao contrário daquela que era a prática existente de poderem votar os portugueses inscritos nos consulados, restringindo deste modo o âmbito de participação? E os problemas fiscais que afectam os trabalhadores consulares, necessitam do quê para terem resposta? Por exemplo, um funcionário pode receber quatro mil euros em França, tendo presente o custo de vida nesse país, mas depois a tributação sobre esse valor efectuada em Portugal ignora isso e esse funcionário é tributado como se ganhasse aquele valor e vivesse em Portugal. Tem isto algum sentido? E outros exemplos poderiam ser referidos.
Isto é, se há problemas que requerem tempo, até porque a sua resolução passa pelo estabelecimento de mecanismos entre o Estado português e países estrangeiros, muitos outros problemas têm somente a ver com medidas a adoptar pelo Governo português. Comece-se por esses (!) sem arrastar a sua resolução.
É que podem continuar os encontros ali, os diálogos acolá, etc., etc. Normalmente, iniciativas para uma «nata» da comunidade. Mas aquilo que é mesmo necessário são medidas concretas que resolvam problemas. E não é por falta de análise dos mesmos e de propostas concretas. Ao longo dos anos, conselheiros das comunidades e o próprio Conselho das Comunidades, sindicatos das diferentes áreas de actividade, estruturas sócio-culturais e recreativas, etc., têm remetido os seus contributos. Não têm faltado seminários, debates, entrevistas. Faltam mesmo as medidas.
O reforço dos laços identitários com as comunidades portuguesas, tão mais necessário no contexto de agravamento da crise social e política na União Europeia e das suas diversas expressões, requer pôr em marcha políticas multifacetadas que, accionando diversos vectores, convirjam para esse mesmo objectivo. Só assim se impulsionará um processo capaz de gerar confiança e empenhamento. Condições que não se criam nem desenvolvem se as opções políticas continuarem reféns das imposições externas e de ultrapassadas concepções sobre as comunidades. Aquilo que faz cada vez mais falta é uma política consubstanciada num projecto estatégico nacional, soberano, que responda de forma integrada nos seus múltiplos vectores, a política patriótica e de esquerda que o PCP preconiza.